01 fevereiro 2014

Sorte ou Azar? - Capítulo 10


- Não acredito - A mão de Petra estava tremendo enquanto ela punha uma pilha de panquecas no meu prato. - Ainda não consigo acreditar. Em uma semana ele vai estar aqui. Só uma semana! É bom demais para ser verdade. 
Evitando cuidadosamente o olhar carrancudo de Miley, peguei o jarro de calda e disse: 
- Bom, acho fantástico, Petra. Mal posso esperar para conhecê-lo.
- Willem é maneiro - Braddy enfiou uma garfada de panqueca na boca. – Quanto tempo ele vai ficar, Petra? 
- Dez dias. – Os olhos azuis de Petra não tinham parado de dançar desde que ela havia desligado o telefone. – Dez dias, com todas as despesas de viagem pagas! Sabe quanto custa uma passagem do meu país para Nova York? 
- Acho que vou começar a escutar rádio – observou Ashley – Talvez eu ganhe uma bicicleta nova. Preciso mesmo de uma bicicleta nova. 
Apesar da euforia, Petra ainda era Petra, e disse com uma aspereza gentil: 
- Ashley, você tem uma bicicleta linda, que ganhou no Natal. 
- É – concordou Ashley. – Mas é bicicleta de neném, com freio no pedal. Quero uma bicicleta de gente grande, que nem a do Braddy, com freio no guidom. Talvez eu ganhe no rádio, como Willem ganhou uma viagem a Nova York. 
Miley olhou carrancuda para a irmã menor, por cima da xícara de café. 
- É só pedir ao papai, pelo amor de Deus. Ele compra a merda da bicicleta para você. 
Petra lançou um olhar pra Miley, porque Braddy e Ashley começaram a rir diante da palavra com M, mas não disse nada. Mudei rapidamente de assunto. 
- Se você quiser um dia de folga para passar com Willem e precisar de alguém para vigiar esses dois – fingi lançar um olhar sério para meus primos sorridentes – é só avisar. 
Petra me deu um sorriso glorioso. 
- Obrigada, Demi. Vou querer. 
Miley fez careta e murmurou para mim: 
- Puxa-saco. 
Ignorei-a.

E mais tarde, quando estávamos saindo de casa para escola, Miley falou ríspida: 
- Não pense, Jinx, que o fato de o namorado de Petra ter ganhado essa viagem idiota tenha alguma coisa a ver com você ter tirado aquela foto da caixa de Mouche. Ou com seu feitiço de amarração idiota. 
Me cuidei para manter o rosto inexpressivo: 
- Eu nem sonharia com uma coisa dessas. 
- Porque ontem à noite eu também fiz um feitiçozinho de amarração. Veremos como sua magiazinha de abóbora caipira funciona contra a coisa de verdade. 
- Acho que veremos, sim – imaginei como a coisa havia chegado àquele ponto: minha prima e eu lutando para ver quem era a bruxa mais poderosa. 
Tipo, estupidez é pouco! 
Não pude deixar de me sentir um pouquinho culpada. De certa forma, Miley tinha direito de estar com raiva: para ela, eu provavelmente havia parecido a maior hipócrita do mundo, fingindo não saber do que ela estava falando na noite em que cheguei. Quando, na verdade, eu sabia de tudo. Sabia perfeitamente bem. Vovó havia me contado a mesma história – sobre como, na minha geração, nasceria a próxima grande bruxa da família. Tinha sido apenas uma história para dormir, para divertir.
Mas havia causado uma tremenda impressão em mim - a mesma impressão causada obviamente em Miley. Porque, como ela, eu estava convencida de que sabia quem era a bruxa da minha geração. Eu. Claro que era eu. Meu nome era Jinx, não era? Isso, junto com o cabelo ruivo e a história do meu nascimento... eu tinha que ser a bruxa. Eu era a esquisita. Eu era a azarada. 
Mas, para todo mundo na minha família, aquilo era só uma história que vovó contava para nos interessar pela nossa árvore genealógica. Ela própria obviamente não acreditava. Sempre ria o contar, como se fosse a coisa mais hilária de todos os tempos.

Mas não riu quando, última vez em que veio nos visitar, eu disse que havia acontecido com Branwen, sua tataravó. Vovó havia, convenientemente, deixado de lado a parte sobre Branwen ter sido a última mulher morta na fogueira por praticar feitiços no país de Gales, de onde ela viera. Fato facilmente confirmado pela Internet. 
Eu havia procurado o nome de curtição, num dia em que estava entediada no laboratório de informática. Fiquei olhando para a tela, sentido o sangue gelar. Porque de repente não era somente uma história. Era mesmo verdade. Eu era descendente de uma bruxa. 
Vovó teve uma reação filosófica. 
- Ah, bem – disse ela. – Tenho certeza de que Branwen era uma bruxa boa. Era uma curandeira, sabe? Provavelmente fazia trabalho melhor curando as pessoas do que o alquimista da cidade, por isso ele teve ciúmes e a acusou de bruxaria. Você sabe como eram as coisas na época. – Vovó tinha acabado de ler O código Da Vinci - Era tudo politicagem. 
Politicagem ou não, uma parente minha havia sido morta – morta! – por praticar bruxaria. Claramente não era uma coisa com a qual mexer. Uma coisa que eu havia aprendido do modo mais difícil quando, apesar do que sabia sobre Branwen, fiz meu primeiro feitiço e vi a coisa dar tão tragicamente errado. 
Por isso eu sabia que Miley precisava ser impedida – tivesse ou não "o dom" que vovó garantiu que uma (ou duas) de nós havia herdado de Branwen. Assim, enquanto Petra colocava Braddy e Ashley na cama na noite anterior, eu me esgueirei em seu apartamento do porão e pus furtivamente uma moeda, com a cara para cima, em cada canto do quarto de Petra. Depois borrifei um pouco de sal marinho na soleira de cada porta que dava para o apartamento dela. 
Por fim anotei o nome de Miley num pedaço de papel branco e guardei embaixo das bandejas de gelo na geladeira de Petra. Sem dúvida, Petra ficaria confusa com aquilo, se descobrisse, mas pelo menos estaria em segurança...

Mas deu para perceber que seria difícil convencer Miley de que o que ela estava fazendo era errado. Na verdade, a culpa era da vovó, por ter enchido a cabeça dela com essa conversa sobre nosso destino. Se eu nunca tivesse ouvido falar que era descendente de bruxa, talvez nunca tivesse pego aquele primeiro livro sobre feitiços, o que encontrei na biblioteca da escola em Hancock – que usei para fazer o primeiro feitiço, que havia mudado tanto a minha vida...
... e infelizmente a de outra pessoa, também. 
Mas se eu nunca tivesse feito aquele primeiro feitiço, claro, que nunca teria vindo para Nova York. 
E nunca teria conhecido Joe. 
Verdade, quando eu pensava nisso, tudo – a coisa na minha cidade, a dor e a solidão de estar longe da minha família e começando numa escola nova – parecia valer a pena quando levava em conta que toda essa confusão havia me permitido conhecer Joe. 
Joe que, na verdade estava apaixonado por outra. Mas também, sem uso de qualquer magia, branca ou negra, ainda era meu amigo. 
E isso era alguma coisa. Era realmente alguma coisa. 
Mesmo assim, levando em conta tudo que havia acontecido entre nós, não fiquei particularmente surpresa quando Miley começou a me dar gelo. Eu estivera mesmo pensando no motivo pelo qual isso não havia acontecido antes. A única explicação racional era que Miley gostava de ter por perto alguém que pudesse cutucar sem misericórdia. E como tento não levar a sério as observações de Miley, não me incomodava em ser essa pessoa. Mas quando me aproximei da mesa do almoço de Miley, na manhã em que Petra anunciou que Willem havia ganhado o concurso, ela me olhou e disse: 
- Nem... pense... nisso.

Bem, até uma garota do interior como eu sabe entender uma deixa. 
Se bem que, na verdade, eu até achei melhor sair de lá. Nunca gostei de ficar com ela mesmo, sempre pensei que me sentar com o pessoal da orquestra seria melhor.
Peguei uma bandeja e fui me sentar na mesa onde freqüentemente via meus colegas da orquestra. Ainda não havia ninguém ali, mas eu esperava que, quando eles chegassem, não optassem por se sentar em outro lugar ao me ver ali. Para não parecer exageradamente amigável, peguei meu livro de história norte-americana na mochila e o abri. 
Mal havia lido uma página sobre Alexander Hamilton quando outra bandeja bateu na mesa, ao lado da minha. Olhei para cima e vi Taylor ocupar a cadeira ao meu lado. 
- Meu Deus – Taylor abriu uma lata de refrigerante diet. – Sua prima é uma tremenda vaca. 
Levantei as sobrancelhas. Aparentemente não era necessário responder, porque Taylor continuou falando: 
- Tipo: eu aguento a balada. Na verdade, eu adoro uma balada. mas não toda noite. – Taylor arregalou significativamente os olhos azuis. – A gente precisa de um sono de beleza. Não posso ficar na rua até depois da meia-noite sempre. Em primeiro lugar, meu dermatologista iria me matar, mas, em segundo, olheiras. – Ela apontou para as pálpebras. – Está vendo? Estão aí. Olheiras. Olheiras. E só tenho 16 anos. Mas não é só isso. – Taylor mordeu um pedaço de cenoura. – São essas novas amigas dela. Essas supostas feiticeiras, Chelsea e Emily. Olha, sou totalmente aberta para coisas novas. Até fui a uma reunião delas. Você sabe, um encontro de bruxas. Foi uma palhaçada. Um monte de garotas vestidas de preto e correndo de um lado para o outro, invocando o espírito do Leste... Eu tipo perguntei: "Ah, dá para alguém me contar o que aconteceu em Grey’s Anatomy ontem à noite?" – A voz de Taylor baixou dramaticamente. – Mas ninguém sabia. Fala sério! E ainda ficaram nervosas comigo por estar "atrapalhando o feitiço". Me poupe! 
Tomei um gole do meu refrigerante e disse: 
- Talvez seja só uma fase. Talvez ela se canse logo disso.

- Ela, não. – Taylor começou a desembrulhar um bolinho Hostess. Parece que a teoria dela era que, se não comesse nada além de refrigerante diet e cenoura no almoço, poderia se recompensar com uma sobremesa. – Desde que ouviu falar naquela tata-tata-tataravó, ela mudou. É como se tivesse virado Paris Hilton, ou sei lá quem. Só que sem as compras divertidas e o chihuahua. De repente tudo tem a ver com festas, esmalte preto e jogar feitiço nas pessoas. Estou dizendo, ela acha mesmo que é uma bruxa. E tudo bem, respeito totalmente a religião dos outros, e coisa e tal, mas aí ela começou a ameaçar as pessoas com feitiços. Primeiro eram só professores, garotos e as garotas mais velhas e maldosas, sabe? Mas depois fui eu. Eu aguento muita coisa, mas saber que alguém fez um feitiço contra mim porque não quis ajudar a catar cogumelos à luz da lua crescente... 
- Catar o quê à luz da lua crescente? – perguntei. 
- Não sei. Uns cogumelos que só crescem em lápides. Ela pediu agora mesmo para eu ir com ela num cemitério na Wall Street no meio da noite, ajudá-la a raspar cogumelos de umas lápides velhas e meio desmoronadas... Bom, eu disse a ela para esquecer. Não vou a nenhum cemitério antigo, e além disso, Robert e eu temos planos para esta noite, sabe? Ele é meu namorado, afinal de contas, mesmo quando é meio débil. Mesmo assim, ele é bonito e mais legal quando não está doidão. Só gostaria que ele parasse de andar com o idiota do Liam. Não sei o que Miley vê nele. Não sei mesmo. Aquele cara é roubada. Mas é popular e por isso My se encontra com ele todo dia na sala da caldeira... – Ela balançou a cabeça até que as trancinhas de seu cabelo chacoalharam. - Mas sabe o que ela me disse? Que não precisa da minha ajuda, porque as amigas DE VERDADE vão ajudar. Chelsea e Emily, claro. Então eu disse: "Ótimo, se suas amigas DE VERDADE são tão fantásticas, pode almoçar com elas." E ela disse: "Ótimo, pelo menos minhas amigas DE VERDADE têm assunto para falar, além de compras." E eu disse...

Não conseguia mais prestar tanta atenção no que Tay estava falando...
Cogumelos em lápides? O que Miley poderia estar aprontando? 
- Olha – disse Taylor, casual, pegando com o dedo um pouco do recheio do bolinho. – Gosto de você, Jinx. Você é meio nerd, com aquele seu violino e todo o resto, mas você não maltrata as pessoas e parece que não está nessa de bruxaria, ou roupas e peso, nem em entrar para a faculdade certa, como todo mundo por aqui. Quer ser minha nova melhor amiga? 
Eu estava tomando um gole de refrigerante quando Taylor perguntou isso – e quase engasguei. Era a cara dela, pelo menos pelo que eu já conhecia, perguntar uma coisa assim, na lata. "Quer ser minha nova melhor amiga?". Como é que eu poderia dizer não a um pedido desses, mesmo que quisesse? 
E, pelo que descobri, não queria recusar. Eu gostava de Taylor. 
E achei que Selena, com quem eu ainda falava todas as noites pelo MSN e mandava MUITOS e-mails, entenderia. 
- Claro – respondi. – Mas... é... só até você fazer as pazes com My. Porque sei que ela adora você, Taylor. Ela só está passando por uma fase. Na verdade, talvez o que a gente devesse fazer era deixar claro que estaremos aqui para lhe dar o maior apoio, assim que ela estiver pronta para... é... se acalmar. 
- Ou não – disse Taylor. – Estou cansada de Miley ficar mandando em mim. Ei, quer ir lá em casa depois da aula? Estou tentando decidir um penteado para o baile da primavera. Robert vai me levar. A gente podia maquiar uma a outra. Eu ADORARIA pôr as mãos nesse seu cabelo. Já pensou em usar ele preso bem alto? 
- Não. Mas, claro, adoraria. – Ninguém nunca havia me convidado para experimentar penteados. 
- Excelente! – Taylor baixou o tom. – Mas acho melhor avisar: não sou a única em que Miley está jogando feitiços. Ela diz que está jogando um em você também. 
Dei uma mordida na minha salada. 
- Verdade? – E mantive a voz cuidadosamente desprovida de emoção. 
- É. Ela está muito chateada com o negócio de você e Joe. – Taylor pareceu um passarinho quando inclinou a cabeça para mim e perguntou: – Vocês dois estão ficando, ou algo assim?

Não pude deixar de sorrir. Qualquer menção ao nome de Joe parecia causar esse efeito em mim. Era patético. 
- Não. Somos só amigos. 
- Bem, vocês dois passam um bocado de tempo juntos. Minha amiga Camille disse que vocês matam a educação física juntos todo dia. 
- Ele está apaixonado pela au pair – falei depressa. – Sério. 
- É, bem, não é isso que Miley acha. Acha que você está tentando roubar o Joe dela de propósito. Diz que vai colocar um feitiço tão forte em você que você vai desejar nunca ter vindo de Idaho. 
- Iowa. 
- Tanto faz. – Taylor estremeceu, mesmo que estivéssemos num poço de luz do sol que entrava pelas janelas do refeitório. – Não sei, Jinx. Não acredito nesse negócio de bruxaria, mas pelo modo como ela disse... me deu medo. Se fosse você, eu teria cuidado. Tipo, para mim, tudo bem, não preciso morar na mesma casa que ela. Mas é melhor você tomar todo o cuidado possível. 
- Obrigada pelo aviso, mas eu posso cuidar disso. Acho que todos os feitiços de Miley acabaram. Na verdade – acrescentei enquanto olhava Miley jogar fora o que restava de seu almoço e, lançando um olhar de desprezo na nossa direção, e sair do refeitório. – Posso praticamente garantir.

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E então, skyscrapers, o que acharam do capítulo? Já chegamos na metade da fic, o que acharam dela até agora?
~xoxo

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